Formas e formas de obtenção do consentimento

O consentimento é uma das bases legais presentes não apenas na LGPD, mas também em várias outras legislações de proteção de dados. Por isso podemos dizer que existem formas e formas de obtenção do consentimento.

Hoje quero comentar a respeito deste tema porque recebi uma mensagem bastante interessante que me foi enviada diretamente pelo formulário de contato aqui do site. A pergunta foi esta:

Bom dia. Uma dúvida sobre o site. O contato aqui em questão utiliza como base legal o consentimento. Surgiu por aqui uma dúvida e, para fins de aprendizado, pergunto: hoje aqui no menu Contato temos: "Seu nome", "Seu e-mail" e "Sua mensagem". Seria necessário um campo para o titular consentir manifestadamente a inserção dos dados aqui pelo contato? Obrigado pela atenção.

A pergunta é bastante relevante justamente porque toca em um ponto essencial: como obter o consentimento do titular de dados pessoais? Como diminuir o risco de perda de controle dos dados por parte do titular quando a base legal é o consentimento? Como diminuir o risco para o controlador em termos de cumprimento da obrigação de comprovar que o consentimento foi obtido é válido?

Abaixo a minha resposta:

Olá, bom dia,

Sua pergunta é bastante interessante porque traz à tona a diferença entre a definição do consentimento no art. 5º, inciso XII, e o consentimento como base legal no art. 11, inciso I.

No art. 5º, inciso XII, temos que o consentimento é uma “manifestação livre, informada e inequívoca” do titular. Já o art. 11, inciso I fala do consentimento “de forma específica e destacada”.

Essa distinção é importante para a prática porque como no meu formulário de contato não trato dados sensíveis, não preciso ter um consentimento “específico e destacado”. Este tipo de consentimento existe quando temos as famosas “caixinhas” para o titular marcar e concordar com o tratamento de dados pessoais.

Veja que quando alguém envia uma mensagem pelo formulário de contato:

  • a) ela é livre para fazê-lo (ninguém obriga o usuário a enviar uma mensagem);
  • b) ela é informada sobre as finalidades do tratamento, inclusive a respeito do prazo de retenção; e
  • c) a ação é um ato positivo inequívoco porque o titular dos dados age deliberadamente para que a ação seja realizada – afinal ninguém clica no botão “enviar” sem querer.

Em síntese, aqui eu resolvo dois “problemas” de uma vez só:

  1. obtenho o consentimento que preciso como controlador; e
  2. evito a chamada “fadiga do consentimento” para o titular, obtendo o consentimento válido do titular da maneira menos intrusiva possível para o próprio titular.

E este 2º item é o mais importante, já que assim eu consigo efetivamente proteger os dados dos titulares, minimizando o risco. O que quero dizer é que muitas vezes as questões ligadas ao consentimento não são lidas pelos titulares (a gente sabe que na prática é isso que acontece), e obviamente isto é um risco à privacidade dos titulares.

Por isso tudo a não necessidade de um consentimento explícito aqui no formulário de contato.

E você, acha que existem formas e formas de obtenção do consentimento ou apenas uma maneira é válida? Qual a sua experiência no design de mecanismos para a obtenção de consentimento válido? Compartilhe aqui nos comentários!

11 comentários em “Formas e formas de obtenção do consentimento”

  1. Matheus, bom dia.
    Ainda sobre o consentimento, vc entende que ao realizar uma campanha interna estimulando os empregados a participarem, enviando foto, o mero ato do empregado enviar foto de acordo com as diretrizes do empregador constitui consentimento válido? Exemplo: campanha de homenagem ao dia das mães em que a empresa estimula as empregadas a enviarem foto com seus filhos.

    • Olá Bruno. Não, neste caso este consentimento “simplificado” não é válido. Isto porque se há crianças envolvidas, caímos no art. 14. O § 1º deste artigo diz que “o tratamento de dados pessoais de crianças deverá ser realizado com o consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou pelo responsável legal.” Portanto aqui o consentimento precisaria ser livre, informado, inequívoco, específico e em destaque, já que são condições complementares neste caso. Abraços!

      • Professor Matheus, boa tarde!
        Aproveitando a discussão, quando há um curso on line nas plataformas digitais, como Zoom, por exemplo, e os organizadores querem tirar uma foto dos alunos para usar em suas respectivas redes sociais para fins de divulgação, a mera solicitação de abertura de câmeras (ou não fechá-las, se for o caso) pode ser uma forma de consentimento válido?
        Muito obrigada!

        • Olá Gabriela! Excelente pergunta. Eu entendo que sim. Novamente, tendo os componentes de transparência, entendo ser válido. Imagine o professor dizendo algo como “Gente, vou tirar uma foto da turma para postar no LinkedIn”. Todos sabem que os dados estarão públicos, em uma rede social. Todos sabem a finalidade, cujos dados são proporcionais. Então as pessoas estão informadas, são livres para abrir a câmera ou não (desde que não sofram represálias pelo professor, claro), e se abrem a câmera, é de se imaginar que isto seja um ato inequívoco. Como não há dados sensíveis, não haveria problema. O único ponto eventualmente questionável é o prazo de retenção por um lado, e, por outro, as próprias políticas das redes sociais (por exemplo, a rede social permite “web scraping” ou não? Porque se permitir isto pode gerar um risco maior aos envolvidos na foto – basta ver o que a empresa ClearView fez e continua fazendo…). Abraços!

      • Matheus, além do fato da possibilidade de envolver crianças, existe a possibilidade da funcionária se sentir coagida a fazê-lo por receio de ficar mal vista pela gerência
        Concordo com você que neste caso as condições que envolvem a campanha devem ser bem explicadas

  2. Mestre,

    Entendo que no caso de formulários, onde os dados coletados são necessários para atendimento do titular, que está preenchendo um formulário para seu benefício, a hipótese legal não seja o consentimento, mas sim o Interesse Legítimo, de acordo com o art. 10, II da LGPD:

    “Art. 10. O legítimo interesse do controlador somente poderá fundamentar tratamento de dados pessoais para finalidades legítimas, consideradas a partir de situações concretas, que incluem, mas não se limitam a:

    II – proteção, em relação ao titular, do exercício regular de seus direitos ou prestação de serviços que o beneficiem, respeitadas as legítimas expectativas dele e os direitos e liberdades fundamentais, nos termos desta Lei.”

    A parte que cabe aqui no ‘caso concreto’ de solicitação da informações ou contato que parte do titular é “prestação de serviços que o beneficiem, respeitadas as legítimas expectativas dele e os direitos e liberdades fundamentais, nos termos desta Lei.”

    Note que é um serviço (informação ou contato) que o beneficia, senão não o faria, e dentro de suas expectativas, visto que o requereu por ação positiva.

    Só é importante que não sejam solicitadas informações acima do necessário para tal finalidade e que se tenha um ‘disclaimer’ de transparência na página do formulário, informando a forma de tratamento, se há compartilhamento, o prazo de retenção, etc.

    A princípio, não há como se falar em ‘consentimento implícito’, de acordo com o texto legal (destaque seus).

    Abraços!

    Salomão

    • Olá Salomão. Neste caso poderia sim ser o legítimo interesse. Penso aqui mais em termos práticos, de documentação para comprovação do princípio da responsabilização e prestação de contas. Em um simples formulário de contato, entendo ser mais simples indicar que o consentimento do titular foi concedido (nos moldes indicados no texto) do que preparar a documentação para comprovar que o legítimo interesse é a base legal. Até porque o § 3º do art. 10 diz que a ANPD poderá solicitar ao controlador RIPD quando o tratamento tiver como fundamento O interesse legítimo. Não acredito que fosse o caso, mas seria plenamente possível que a ANPD solicitasse um RIPD porque a empresa tem um formulário baseado no legítimo interesse. Ao usar o consentimento, eu diminuiria não apenas o risco para o titular, mas também para a empresa. Por fim, não entendi muito a parte do “consentimento implícito”, pois o texto não fala sobre isto (que realmente não existe nem na LGPD, nem no formulário em si). Um abraço!

  3. Bom dia Professor Matheus!
    O que você acha da frase “fuja para as montanhas mas não use consentimento e nem legítimo interesse “, como fundamento que são hipóteses de tratamento frágeis e cheia de requisitos.

    • Olá Vanessa. Eu acho que é mais frase de efeito do que frase real. Porque no fim das contas, na prática estas são as duas bases legais mais relevantes e mais utilizadas. Portanto, não tem como escapar desses requisitos. E não acho que sejam frágeis, desde que bem utilizadas e documentadas. Abraços!

  4. Olá, Prof. Matheus, tudo bom com vc?
    Primeiramente, parabéns por abordar um conteúdo tão básico e essencial de forma tão didática.
    Por gentileza, atuo com proteção de dados e uma dúvida que enfrentamos se relaciona ao que você denomina como tratamos de dados para participar de Seleções culturais, por exemplo. Geralmente, a pessoa candidata têm acesso a um “aviso de privacidade com termo de consentimento” que explica as bases legais e finalidades para a coleta de certos dados pessoais. Você entende que contemplar uma caixinha para ciência e concordância não induz a ser entendido que está-se diante da base legal de consentimento, quando poderia ser aplicado execução de contrato na modalidade preparatória? Além disso, se a base legal for o consentimento, teria que haver um aviso claro sobre a forma como revogá-lo, com o contato do DPO? Agradeço a possível resposta. Já vi suas aulas sobre política de privacidade e gostei muito. Você fala sobre temas pouco abordados de forma específica.

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